sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Desconfiar-se para existir

Hoje, 13 anos depois, é difícil saber até onde íamos em busca do quadro perfeito, da fala perfeita...
(…) Interferíamos a ponto de maquiar o boxeador? De exagerar o seu suor? Assistindo ao material bruto fica claro que tudo deve ser revisto com certa desconfiança.


As imagens e as palavras acima fazem parte do documentário “Santiago” de João Moreira Salles. A idéia inicial do documentarista, em 1994, era a de realizar um filme sobre Santiago, mordomo da família Salles, mas o projeto foi abandonado pelo diretor e o material filmado acabou sendo arquivado e retomado, somente, 13 anos mais tarde.

“Há treze anos, quando fiz estas imagens, pensava que o filme começaria assim: Primeiro uma música dolente. Não essa que eu só conheci mais tarde, mas algo parecido; depois um movimento lento em direção a três fotografias.” (SANTIAGO, 2007)

Neste ponto Salles resolveu, a grosso modo, fazer um filme do filme esboçando algumas considerações acerca daquilo que havia filmado. “Santiago” é definido, por alguns críticos, como um exercício de problematização do gênero documentário pelo tensionamento entre ficção e realidade que ele carrega. Concordo, mas gostaria de abordar “Santiago” como arqueologia da tessitura de um documentário. Nele, o mordomo e personagem Santiago é transposto pelo pensamento sobre si de Moreira Salles.

“[...] é a descoberta de um pensamento como 'processo de subjetivação': é estúpido ver aí um retorno ao sujeito, trata-se da constituição de modos de existência ou como dizia Nietzsche, a invenção de novas possibilidades de vida. A existência não como sujeito, mas como obra de arte; esta última fase é o pensamento-artista.” (DELEUZE, 1992, p. 120)

O que é real em “Santiago”? O mordomo, Santiago Badariotti Merlo, da casa em que Salles passou a infância? João Moreira Salles e sua direção tirana? Ou as considerações de Salles, 13 anos depois, acerca das imagens produzidas? Da proposta de documentário, se tece uma ficção de si enquanto autor. Salles transforma em obra de arte sua experiência de alteridade. Salles se transforma a partir da prática concreta de voltar-se a si mesmo, interpelado pelas imagens que produziu. Saindo de si para voltar transformado, desdobrando-se naquele que vê, se vê e produz imagens. Salles constrói a si como personagem no imbricamento entre ficção e realidade. “Santiago” é experiência.
Mais do que questionar o modo como um documentário atua e intervém na realidade e negar a capacidade de apreensão da mesma através da câmera, Moreira Salles tece seu filme num sentido de exposição de si, uma vez que “Santiago” se estrutura no que está nas entrelinhas, no fora de quadro, naquilo que é dito quando a câmera está desligada ou na imagem captada sem o som. Ou seja, na experiência do fazer fílmico que constrói e medeia a relação consigo, com o Outro e com as imagens produzidas. O entrelaçamento desta tríade é possibilidade para a criação e transformação de si, deixando um espaço aberto para a imaginação que diluí as fronteiras entre ficção e realidade.
Sob um rápido olhar poderíamos inferir que “Santiago” trata-se de um filme dual – ao mesmo tempo em que o personagem Santiago é construído, é também construído o cineasta e documentarista João Moreira Salles. Santiago, figura peculiar, versado em literatura, música e arte. João, autoritário e controlador, distante de Santiago e próximo de seus propósitos enquanto cineasta. Seriam estes aspectos que conformam a existência de Santiago e Salles? Podemos inferir que o documentário “Santiago” de treze anos atrás seria completamente diferente do de agora, assim como seu personagem e diretor/personagem. Imagens e palavras tecem uma narrativa mutável e nômade em que tudo deve ser visto com certa desconfiança.

Título: Santiago; País: Brasil; Gênero: Documentário; Tempo: 80 minutos; Ano: 2007.


Bibliografia
DELEUZE, Gilles. A vida como obra de arte. In: _____. Conversações. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992.

sábado, 13 de dezembro de 2014

Mostra da Oficina Popular de Filmagem

A oficina Popular de Filmagem: produção de imagens a partir da (des)construção do olhar, realizada na Casa de Cultura Mario Quintana (Porto Alegre/RS) no período de 08 de Outubro a 17 de Dezembro e ministrada por Luciana Tubello, terá a sua Mostra de encerramento no dia 20 de dezembro (sábado), a partir das 20hs, na sala A2B2 – 2º andar da Casa de Cultura Mario Quintana. A oficina teve como proposta produzir imagens por uma perspectiva ético-estética, trabalhando os aspectos sócioculturais na produção de imagens, bem como problematizando e questionando o fazer fílmico estimulando a reflexão e abrindo possibilidades para o surgimento de uma prática artística enraizada na (des)construção do olhar de cada oficinando.

A entrada é franca.




Programação

4 meses entre os Skine’thétis (Four months among the Skine’thétis)

Duração: 10 min.
Gênero: Pseudodocumentário
Direção: Mateus Pereira
Roteiro: Mateus Pereira
Edição: Mateus Pereira
Som: Mateus Pereira
Imagens: Mateus Pereira
SINOPSE
Neste mini pseudodocumentário mudo, inspirado no cinema documental de Robert J. Flaherty, acompanhamos momentos dos 4 meses em meio aos Skinothétis. Pensando na provocação de Vilém Flusser, para quem toda pessoa com uma câmera na mão é nada mais que um “caçador na floresta densa da cultura”, nos aproximamos do cotidiano de um grupo de indivíduos que se encontra ritualmente para resolver as seguintes questões: o que filmar? E como filmar?

Amanhã às 10

Duração: 20 min
Gênero: Ficção
Direção: André Bozzetti
Roteiro: André Bozzetti
Edição: André Bozzetti
Som: André Bozzetti
Imagens: Pedro Mendes
Elenco: Amanda Gatti, Érico Fasolo, Iasmin Schleder, Kailane Rodrigues, Luís Adriano Fragoso, Mateus Pereira e Olívia Bozzetti.
SINOPSE
O prazo para entrega do TCC de Alice (Iasmin Schleder) está se esgotando. Ela tem cerca de 12h para finalizar seu trabalho. Alice, no entanto, não consegue focar sua atenção no que precisa ser feito, visto que pensamentos inquietantes não param de surgir em sua mente. Enquanto seu cérebro fervilha, uma tempestade se aproxima.

ANTOINE

Gênero: Ficção
Direção: Felipe Casco, Juliana Ruiz e Rodrigo Moraes
Roteiro: Felipe Casco, Juliana Ruiz e Rodrigo Moraes
Edição: Felipe Casco e Rodrigo Moraes
Som: Felipe Casco e Rodrigo Moraes
Imagens: Juliana Ruiz; Rodrigo Moraes.
SINOPSE
Jovem pseudoartista está em crise existencial, frustrado com as dificuldades de viver de arte no Brasil, ele se questiona sobre a vida, o cotidiano e a arte.

Percurso, Pesquisa, Percussão!

Duração: 20min.
Gênero: Documentário
Direção: Mateus Pereira
Roteiro: Mateus Pereira
Edição: Mateus Pereira
Som: Mateus Pereira, Maxine Fonseca, Naíla Cazuza, Taiane Rodrigues.
Imagens: Mateus Pereira, Maxine Fonseca, Naíla Cazuza, Taiane Rodrigues.
SINOPSE
Naíla, Maxine, Taiane e Tainara, quatro estudantes de Ensino Médio e um trabalho de pesquisa para fazer. No percurso acompanhamos o desvelamento e o contato com sua própria ancestralidade. Dessa experiência surge o leitmotiv desse documentário: uma pesquisa só é viva, quando descobrimos e construímos nossa própria identidade através dela.

Peço – Bhia Tabert

Duração: 4min
Gênero: clipe musical
Direção: Mariana Lovato e Priscilla Ceolin
Roteiro: Bhia Tabert, Mariana Lovato e Priscilla Ceolin
Edição: Mariana Lovato e Priscilla Ceolin
Som: Malu de Moura e Priscilla Ceolin
Imagens: Mariana Lovato e Priscilla Ceolin
SINOPSE
Clipe musical da música Peço, de autoria da compositora Bhia Tabert.

Vaidade

Duração: aprox. 10 min
Gênero: Ficção
Direção: Renan Almeida
Roteiro: Renan Almeida
Edição: Leonardo Nunes e Renan Almeida
Som: Renan Almeida
Imagens: Leonardo Nunes
SINOPSE
Michel é um renomado estilista que se encontra em conflito com sua criatividade. Ele está na companhia de uma misteriosa mulher a quem ele trata como a "musa" de suas criações, que está cansada de ser escondida por ele e que agora passa a reinvidicar a sua liberdade.