domingo, 9 de junho de 2013

Pré-estréia do filme Doméstica em Porto Alegre

A Sala de Cinema Paulo Amorim – na Casa de Cultura Mário Quintana – recebeu neste sábado (8 de junho), o seminário “Cinema Brasileiro Pra Quem?”. Promovido pela Associação de Críticos de Cinema do RS (Accirs) e a Cinemateca Paulo Amorim. Este encontrou visou ampliar a discussão sobre o conceito de “cinema irrelevante” proposto pelo crítico Jean-Claude Bernardet, que trata dos filmes que se apresentam como “irrelevantes” à lógica economicista e de mercado porém, com boa avaliação da crítica, destacando-se narrativa e esteticamente dos demais. Para debater este tema estavam presentes o documentarista Eduardo Escorel, o cineasta Jorge Furtado e o jornalista Luiz Zanin Oricchio, presidente da Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Como encerramento, tivemos a pré-estréia do documentário “Doméstica”, de Gabriel Mascaro.

Em “Doméstica” a câmera não penetra, ela demarca o lugar do outro. O lugar da empregada doméstica, que é [quase] da família. Na sinopse lemos: “sete adolescentes registram, por uma semana, o cotidiano de suas empregadas domésticas”. É deste ponto de vista que a narrativa é construída. É este o ponto de vista que a câmera assume: “suas empregadas domésticas”. Sua: pronome possessivo feminino; próprio ou relativo à 3ª pessoa do discurso

As trajetórias destas mulheres além de superficiais se apresentam de forma estática, negando uma tomada de consciência dos tempos superpostos que hierarquizam seus projetos de vida e delineiam o percurso de suas trajetórias. O tempo existente é do trabalho, é do doméstico. Esse tempo nunca é distendido, ele sempre é cortado ora por um telefone que toca, ora pela mão do próprio diretor/editor Gabriel Mascaro.

O filme se propõe como um ensaio sobre afeto e trabalho. Paradoxalmente o que mais falta é afeto. Os diálogos – que revelariam uma relação de afeto mútuo – são mínimos, o que vemos são respostas monossilábicas por parte das trabalhadoras e perguntas superficiais por parte dos adolescentes. Estes, protagonistas no discurso – quem segura a câmera é quem conta a história. Enquanto as domésticas, são o objeto do olhar do outro. Assim como, “Nanook, O Esquimó”, de Robert Flaherty, visível em sua prática, mas ausente em sua subjetividade.

O problema de “Doméstica” está na câmera que caiu em mãos erradas, provando que nem sempre imagens brutas podem ser salvas por uma edição bem intencionada.

Título: Doméstica
País: Brasil
Tempo: 85 minutos
Ano: 2013
Direção: Gabriel Mascaro



post scriptum: A pré-estréia do filme “Doméstica” foi antecedida por um debate muito interessante sobre o conceito de “cinema irrelevante”, perpassou as leis de incentivo e culminou na falta de um público que prestigie o cinema nacional. Pois bem, ao longo deste debate a sala estava lotada, com aproximadamente 120 pessoas. Após o coquetel, destas 120 pessoas, 20 (sendo generosa) permanecerem para prestigiar o filme de Gabriel Mascaro, “Doméstica”.

Deixo as conclusões para você, caro leitor!

sábado, 27 de abril de 2013

Tarantino sem Sally Menke

De "Cães de Aluguel" até "Bastardos Inglórios", Quentin Tarantino teve como seu braço direito a montadora Sally Menke, que morreu em 2010, aos 56 anos e sem ganhar um Oscar da Academia. "Django Livre" é o primeiro filme de Tarantino sem Sally Menke e isso é perceptível já nos primeiros minutos de filme. Veja bem, não estou dizendo que "Django Livre" seja ruim, “Django” é um excelente filme, mas falta algo de Tarantino nele: temos a violência, o sangue, os diálogos inteligentes, mas... Falta! Falta a mão precisa e rápida da montadora Sally Menke, uma das responsáveis pelo estilo Tarantino, com uma montagem dinâmica, que abusa dos planos curtos. Esse dinamismo não aparece em “Django”, com exceção de algumas cenas, como por exemplo, no flashback da vida do casal Django e Brunhilde, que lembrou muito o estilo Sally Manke de montar; aquela sucessão de planos milimétricamente enlaçados e que não deixam o espectador respirar, muito menos desgrudar os olhos da tela.
 
Fred Raskin assumiu o posto de Manke com competência, mas também, com um certo receio. Percebemos isso em seu corte comedido e sem muita ousadia. Mas a culpa não é Fred Raskin, esse receio também está no roteiro de Quentin Tarantino. Em relação aos seus filmes anteriores (com exceção de “À Prova de Morte” e “Jackie Brown”) a estrutura narrativa do filme não é dividida por capítulos e nem foi concebida de uma maneira completamente não linear. Ou seja, “Django Livre” tem uma estrutura narrativa linear e cronológica, e é neste ponto que percebemos o quanto a figura de Sally Manke se destacou, como uma das melhores e mais criativas montadoras dos últimos tempos.

Durante as filmagens, Tarantino pedia para que os atores
dessem um "olá" para Sally, que veria todo o material
na sala de edição.

Se hoje, compreendemos os filmes de Tarantino – o seu tempo diegético fatiado em mil pedaços que não seguem uma linearidade – devemos isso a Sally Menke, que juntou estes mil pedaços lançados por Tarantino, dando sentido à sua louca genialidade. Quentin Tarantino não foi o único responsável, por fazer de Pulp Fiction o filme mais reconhecido e influente da década de 90. Este mérito, sem sombra de dúvida, deve ser dividido com Sally Menke, que fez muito mais do que ligar um plano no outro; ela abriu escola, lançando um novo “sentido” e “forma” (Eisenstein, 2002) de montar. Para finalizar, eu gostaria de reiterar que “Django Livre” é um excelente filme. Porém, ele é o anúncio do tamanho da perda que Sally Manke representa, não só para Tarantino, mas também, para o cinema.

terça-feira, 16 de abril de 2013

Agarrando Pueblo - Luis Ospina

Recentemente fiz um post sobre Un tigre de papel de Luis Ospina e neste final de semana tive o prazer de ver/conhecer outra obra deste diretor – Agarrando Pueblo. É uma pena que um diretor como Ospina seja pouco lembrado por aqui (Brasil). No site de relacionamento Filmow, por exemplo, constam apenas duas obras: Un tigre de papel e Agarrando Pueblo. O primeiro foi assistido por uma pessoa (vale frisar que eu fui a pessoa quem marcou como visto e também cadastrou o filme no site) e o segundo foi visto por 8 pessoas. Pode ser que os meus parâmetros de análise não sejam os mais indicados, mas parto do princípio que o filmow é um site bastante popular, com cerca de 300 mil usuários. Em suma, diante destes dados (ainda que sejam dados incipientes) me sinto no dever de escrever mais sobre este diretor e tecer algumas considerações sobre Agarrando Pueblo (não que eu seja grande coisa, mas tô fazendo a minha parte de ao menos apresentar esse diretor ao meu círculo de amigos). 
Luis Ospina, nasceu na Colômbia em 1949 e estudou cinema na Califórnia, onde fez seus primeiros curtas-metragens. Voltou para Colômbia e a partir dos anos setenta fez parte de um grupo preocupado em promover a cultura cinematográfica no país, através de uma proposta fílmica documental e contra as convenções da produção nacional. É neste contexto que se insere o filme Agarrando Pueblo; uma resposta contundente à “Cultura da Pobreza” de Oscar Lewis – muito em voga na época – parodiando a “pornomiséria” – prática indiscriminada de documentários que, com o pretexto de denunciar as agruras do terceiro mundo, perpetuavam os estereótipos da pobreza.
O filme acompanha uma equipe de filmagem que roda um “documentário” nas ruas e periferias de Cali e Bogotá para uma emissora de TV alemã, manipulando situações e criando personagens ao longo do caminho. Mais uma vez a mistura entre documentário e ficção se faz presente (ver Un tigre de papel) incitando a reflexão: “qual o nosso olhar sobre a pobreza?” ou melhor “sob que parâmetros ideológicos nosso olhar sobre a pobreza foi construído?”.
Diante de questões tão pertinentes e atuais, esta obra merece lugar de destaque, dentre as produções cinematográficas que ousam brincar com a hierarquia social.  E Ospina vai além, invocando para que a base da pirâmide social zombe daqueles que insistem em os olhar por cima.



Título: Agarrando Pueblo
País: Colômbia
Tempo: 28 minutos
Ano: 1977
Direção: Luis Ospina

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Essa estranha amizade homofóbica


Amizade (do latim amicus) deriva de amore (há quem diga que essa palavra vem do grego). Em suma, amizade e amor tem suas aproximações etimológicas e por tudo que aprendi e vivi em minhas relações humanas e sociais, concordo com o que a etimologia diz. Amizade é amor! É uma relação afetiva e como em toda relação de amor/afeto tendemos a desejar o melhor ao outro, neste caso, o nosso amigo.
As coisas começam a se complicar quando ouvimos o maior de todos os clichês homofóbicos: “Tenho vários amigos gays, mas sou contra que eles se casem”. Em outras palavras: “Tenho vários amigos gays, mas sou contra que eles sejam felizes”.
Por isso eu escrevo esse post, para que os usuários deste clichê respondam: Que significado amizade tem para vocês, no mundo de vocês? Porque no meu mundo, amizade é o que o latim (ou grego) disse que era... Amor. E no sofrido aprendizado das relações humanas e sociais eu aprendi que quando a gente ama uma pessoa, a gente quer que essa pessoa seja feliz! Que quando a gente ama; a gente ri, chora e luta junto. Mas parece que nesse estranho mundo da intolerância a amizade significa outra coisa.
Ah, mas sempre tem alguém para dizer: “Mas nós amamos os homossexuais, só não amamos o seu “homossexualismo” (com “ismo” mesmo, porque é assim que eles falam). Mas, antes que comece o blá blá blá que deus (com minúscula mesmo) não aceita o casamento entre pessoas do mesmo sexo, que tá na bíblia e blá blá blá... Eu vou sair na frente e dizer:

“O amigo ama em todos os momentos; é um irmão na adversidade”. (Provérbios 17:17)

“Não abandone o seu amigo nem o amigo de seu pai; quando for atingido pela adversidade não vá para a casa de seu irmão; melhor é o amigo próximo do que o irmão distante”. (Provérbios 27:10)

E agora? Parece que o significado da palavra amizade (como amor e afeto) é universal... Até está nessa tal bíblia! Então, por que vocês distorcem isso? Amizade é uma coisa muito linda e não merece ser usada como arma da intolerância de vocês. Se você não concorda com o casamento gay, então não se case com alguém do mesmo sexo! Simples, assim... E, principalmente, não diga ser amigo de um gay, sendo que você é contra a sua felicidade. Disso, nem a onça gosta!

sexta-feira, 5 de abril de 2013

A produção acadêmica acerca do tema 'empregadas domésticas'

* Subcapítulo de minha Monografia apresentada, em 09 de julho de 2012, como requisito à obtenção do grau de Bacharela em Ciências Sociais.

Gostaria de delinear um panorama do que tem sido produzido a respeito do tema 'empregadas domésticas'. Inicio este panorama trazendo o resultado de buscas no Scielo (www.scielo.org) no mês de junho de 2012, utilizando os indicadores: empregadas domésticas, trabalho doméstico e trabalho doméstico. Desta busca encontrei sete trabalhos produzidos a partir de diferentes áreas de conhecimento.
Na área das ciências humanas temos os artigos de Brites (2007) e Sanches (2009) respectivamente intitulados: Afeto e desigualdade: gênero, geração e classe entre empregadas domésticas e seus empregadores e Trabalho doméstico: desafios para o trabalho decente. Brites (2007) centra a sua análise na questão da ambigüidade afetiva entre os empregadores e as trabalhadoras domésticas reforçando um sistema estratificado e hierárquico de gênero, classe e cor. Sanches (2009) atenta para a importância do conceito de trabalho decente, promovido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), para o trabalho doméstico e a equiparação de seus direitos em relação aos demais trabalhadores e trabalhadoras que que contam com a regulação da CLT.


Na área da saúde temos os artigos: Emprego em serviços domésticos e acidentes de trabalho não fatais e Representações do trabalho informal e dos riscos à saúde entre trabalhadoras domésticas e trabalhadores da construção civil; respectivamente de Santana (2003) e Iriart (2008). O primeiro trabalho trata da alta incidência de acidentes de trabalho entre as trabalhadoras do setor doméstico. O segundo aponta para a questão dos trabalhadores informais da construção civil e das trabalhadoras domésticas, igualmente informais, analisando representações e percepções sobre a informalidade do contrato de trabalho e dos riscos à saúde entre trabalhadores informais acidentados, apontando para a necessidade de construção de políticas públicas visando a segurança e saúde destes trabalhadores e trabalhadoras. 
Na psicologia temos Santana e Dimenstein (2005) com o artigo Trabalho doméstico de adolescentes e reprodução das desiguais relações de gênero, que utiliza os resultados de uma pesquisa realizada com jovens trabalhadoras do setor doméstico – menores de 18 anos – que acumulam tarefas escolares e de trabalho, sob condições trabalhistas desiguais e irregulares. O objetivo deste estudo, realizado em Natal (RN), é analisar o trabalho doméstico de adolescentes na perspectiva das relações de gênero com a categoria de classe social.
Por fim, o mais recente artigo encontrado é da economia: Impacto da redução dos encargos trabalhistas sobre a formalização do trabalho doméstico de Theodoro e Scorzafave (2011), em que avaliam o impacto causal da Lei 11.3241 sobre a formalização do trabalho doméstico no Brasil. Os dados foram extraídos do banco Mensal de Empregos do IBGE entre os anos 2004 e 2007, tendo um resultado inconclusivo, já que, algumas estimativas mostraram efeitos positivos enquanto outras não foram significativas.
No Banco de Teses da CAPES (www.capes.gov.br), no mês de junho de 2012, utilizando o descritor: “empregadas domésticas”, foi localizado 10 trabalhos, na área das ciências sociais sobre o tema, publicados a partir de 2000. 
Nos anos 2000, temos a publicação de Brites (2000): Afeto, desigualdade e rebeldia – bastidores do serviço doméstico; tese de doutorado em que realizou um estudo etnográfico sobre as relações de poder entre as empregadas domésticas e empregadores entre os anos de 1996 e 1998, no estado do Espírito Santos. Também contamos com a publicação da dissertação de mestrado de Barbosa (2000): Articulação casa trabalho: migrantes nordestinos nas ocupações de empregada doméstica e empregado de edifício, este estudo buscou explorar a integração de trabalhadores – homens e mulheres de origem camponesa da região Nordeste – empregadas/os em casa de família ou em edifícios como porteiros ou auxiliares de limpeza. 
Após quatro anos, temos nova publicação: Minha área é casa de família: o trabalho doméstico na cidade de São Paulo, tese de doutorado de Brandt (2004) que analisa a inserção feminina no mercado de trabalho, atentando para a diminuição de empregadas domésticas que dormem no emprego. 
No ano de 2007, houve a publicação de dois trabalhos referentes ao tema: Cursos para trabalhadoras domésticas: estratégias de modelagens de Oliveira (2007) e O que é viver com os patrões? Trabalho e cidadania das empregadas que moram com os patrões de Dias (2007), ambas dissertações de mestrado. O primeiro trabalho trata-se de uma etnografia dos cursos oferecidos para trabalhadoras domésticas e as nuances de seus discursos. O segundo trata do desinteresse que as empregadas domésticas, que dormem no emprego, têm pela atividade. 
No ano seguinte temos a dissertação de mestrado de Harris (2008): Você vai me servir: desigualdade, proximidade e agência nos dois lados do Equador, que parte de um estudo etnográfico comparativo das relações entre empregadas domésticas e seus empregadores, no Brasil e nos Estados Unidos, analisando as particularidades históricas do trabalho doméstico em cada país.
Quatro trabalhos foram publicados em 2009: Ávila (2009) apresentou as práticas de trabalhadoras domésticas na cidade do Recife com a tese de doutorado, buscando compreender as tensões cotidianas em torno do uso do tempo. Oliveira (2009) em Conflitos sobre a categoria trabalho doméstico: entre (in)definições, lutas e mudanças, dissertação de mestrado, analisa a regulação do trabalho doméstico e seu processo de disputas e debates acerca de sua legitimação. Pineyro (2009) também trata da dificuldade de reconhecimento e legitimação do trabalho doméstico pela perspectiva ambigüidade afetiva entre trabalhadoras e empregadoras, em sua dissertação de mestrado intitulada: O pedaço doméstico: empregadas domésticas na luta pelo reconhecimento. Por fim, Santana (2009) na dissertação de mestrado Entre os discursos, as representações e as práticas: crianças e jovens empregadas domésticas na cidade de Marília, trata do serviço doméstico remunerado como um espaço de inserção no mercado de trabalho, que a pesar de seu caráter compulsório e exploratória, era visto como uma oportunidade para a melhoria de vida.


REFERÊNCIAS

ÁVILA, Maria Betânia de Melo. O tempo do trabalho das empregadas domésticas. Tensões entre dominação/exploração e resistência. Tese (Doutorado) – Departamento de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2009.

BARBOSA, Fernando C. Articulação casa trabalho: migrantes nordestinos nas ocupações de empregada doméstica e empregado de edifício. Dissertação (Mestrado) – Universidade Fluminense, Rio de Janeiro, 2000. 

BRANDT, Maria Elisa Almeida. O conflito entre empregadores domésticos e a atuação do sindicato: os sentidos da mediação. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 1998. 

BRITES, Jurema. Afeto e desigualdade: gênero, geração e classe entre empregadas domésticas e seus empregadores. In: Cad. Pagu, Dez, nº 29, 2007. 

________. Afeto, desigualdade e rebeldia – bastidores do serviço doméstico. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2000.

DIAS, Edgar R. O que é viver com os patrões? Trabalho e cidadania das empregadas que moram com os patrões. Dissertação (Mestrado) – Centro Universitário Euro Americano – Direitos Humanos, Cidadania e Violência – UNIEURO, Brasília, 2007.

HARRIS, David E. Você vai me servir: desigualdade, proximidade e agência nos dois lados do Equador. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.

IRIART, Jorge Alberto Bernstein et al. Representações do trabalho informal e dos riscos à saúde entre trabalhadoras domésticas e trabalhadores da construção civil. In: Ciênc. Saúde coletiva, Fev. Vol.13, nº 1, 2008.

OLIVEIRA, Emanuela Patrícia de. Cursos para trabalhadoras domésticas: estratégias de modelagens. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2007.

OLIVEIRA, Raquel Barros de. Conflitos sobre a categoria emprego doméstico: entre (in)definições, lutas e mudanças. Dissertação (Mestrado) – Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro, 2009.

PINEYRO. Fabian J. O pedaço doméstico: empregadas domésticas na luta pelo reconhecimento. Dissertação (Mestrado) – Fundação Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, 2009.

SANCHES, Solange. Trabalho doméstico: desafios para o trabalho decente. Rev. Estud. Fem., Dez, Vol.17, nº 3, 2009.

SANTANA, Juliana N. Entre os discursos, as representações e as práticas: crianças e jovens empregadas domésticas na cidade de Marília. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, São Paulo, 2009. 

SANTANA, Munich and Dimenstein, Magda. Trabalho doméstico de adolescentes e reprodução das desiguais relações de gênero. In: Psico-USF (Impr.), Jun, vol.10, nº 1, 2005.

SANTANA, Vilma S et al. Emprego em serviços domésticos e acidentes de trabalho não fatais. In: Rev. Saúde Pública, Fev, vol.37, nº 1, 2003.

THEODORO, Maria Isabel Accoroni; SCORZAFAVE, Luiz Guilherme . Impacto da redução dos encargos trabalhistas sobre a formalização das empregadas domésticas. Rev. Bras. Econ., Mar, vol. 65, nº 1, 2011.

sábado, 30 de março de 2013

A terra sem lei agora é a terra da expressão artística

É do conhecimento de grande parte dos moradores - e não moradores - de Alvorada/RS o apelido estigmatizador de "terra sem lei". Mas no próximo sábado (06 de abril) esta realidade começa a ser mudada através da Exposição Coletiva Toque de Recolher, iniciativa do Projeto Cores no Gatilho. Cores no Gatilho é um projeto de ações artísticas. A ideia é sugerir mudanças através da arte em Alvorada, considerada uma das cidades mais violentas do Rio Grande do Sul e também, uma das mais violentas do Brasil.

Não é de hoje que a arte é utilizada para subverter a ordem, romper preconceitos e estigmas. Vamos marcar presença nesse evento e ver/mostrar que a Cidade de Alvorada está muito além das páginas policiais.



QUANDO: 06 DE ABRIL (SÁBADO).
ONDE: SuBte Café (Rua São Borja, 211 - Alvorada/RS).
HORÁRIO: 19hs

Página no Facebook: Cores no Gatilho

Email: coresnogatilho@gmail.com

segunda-feira, 18 de março de 2013

AS HIPER MULHERES

O documentário As Hiper Mulheres narra o maior ritual feminino de uma reserva no Alto Xingu, o Jamurikumalu. As mulheres da tribo começam o ensaio do ritual, enquanto a única cantora que de fato lembra/sabe todas as músicas está muito doente. Fato que ocasiona uma verdadeira corrida contra o tempo para que esse conhecimento seja transmitido.
As Hiper Mulheres é um filme sobre relacionamento humano, memória e transmissão de conhecimento fruto de uma produção da Video nas Aldeias (VNA), projeto que desde 1986 apóia a luta dos povos indígenas para fortalecer suas identidades e seus patrimônios territoriais e culturais, através de produções audiovisuais compartilhadas.

O documentário terá exibição nesta quinta-feira (21 de março) às 19 horas, com a presença do diretor Prof. Carlos Fausto (Museu Nacional UFRJ), no Auditório ILEA - UFRGS - Campus do Vale (Av. Bento Gonçalves 9500).

Ficha Técnica

Título: As Hiper Mulheres
País de Origem: Brasil
Gênero: Documentário
Classificação etária: 16 anos
Tempo de Duração: 80 minutos
Ano de Lançamento: 2011
Direção: Carlos Fausto, Leonardo Sette, Takumã Kuikuro
Produção: Associação Indigena dos Kuikuro do Alto Xingu (AIKAX), Documenta Kuikuro (DKK), e Vídeo nas Aldeias.
Prêmios: Especial do Juri e de Melhor Montagem no festival de Gramado.

quarta-feira, 13 de março de 2013

Jonas Mekas em Porto Alegre (Semana de Porto Alegre)


Infelizmente Jonas Mekas não estará presente fisicamente em Porto Alegre, mas estarão (pela primeira vez!) alguns de seus filmes. Essa é uma oportunidade única e ímpar de conhecer a obra deste cineasta lituano de 90 anos, e ainda na ativa que em 1944 foi feito prisioneiro juntamente com o seu irmão num campo de concentração Nazi, durante 8 meses, até ao final da guerra. Mais tarde estudou filosofia na Universidade de Mainz (Alemanha), tendo emigrado em 1949 para Nova Iorque, onde comprou a sua primeira câmera 16 mm da marca Bolex. Começa então a filmar cenas da sua própria vida, tornando-se em um dos expoente do cinema underground e até hoje milita em prol do cinema independente. Seu trabalho é extremamente pessoal, pautando-se pelos acontecimentos dramáticos de sua vida como jovem na Lituânia, evocando suas recordações e experiências pessoais. Seus filmes são um tributo à memória, uma etnografia de si onde cada frame é uma lembrança.
Entre os filmes que serão exibidos entre os dias 19 e 24 de março de 2013 na Usina do Gasômetro - Sala de Cinema P. F. Gastal, estão:

Reminiscências de uma Viagem para a Lituânia: Dividido em três partes, o filme reúne material autobiográfico produzido pelo diretor Jonas Mekas entre 1950 e 1971. A mistura de imigrantes no Brooklyn, as danças e os cantos que reúnem a comunidade lituana em Nova York são tema da primeira parte, realizada com material filmado entre 1950 e 1953, primeiros anos de Mekas na América. A segunda parte foi rodada na Lituânia, em 1971, e mostra Semeniskiai, sua cidade natal. A última parte focaliza um campo de concentração em Hambrugo, onde Mekas ficou preso com o irmão, e lugares por onde esteve na Áustria enquanto era refugiado.

Lost Lost Lost: É o registro de procura de um cineasta pela razão da imagem, ou pela função de suas imagens no mundo. Na prática, a biografia de um cineasta contada por suas imagens: imagens-espelho, imagens-ação. O que sai disso não é um produto acabado, mas um cinema em construção, obra de um cineasta em exercício político no mundo.

Cenas da Vida de Andy Warhol
Cenas da Vida de Andy Warhol: Amizades e Interseções: Colagem das filmagens que Mekas fez de Warhol durante o período em que conviveram. O filme alterna sequências mostrando a dimensão pública de Warhol – vê-se sua retrospectiva no Whitney Museum, o primeiro concerto do Velvet Underground –, com outras retratando momentos cotidianos e íntimos: na praia, com amigos. Vemos EdieSedgwick, Gerard Malanga, George Maciunas, Yoko Ono, John Lennon, Caroline e John Kennedy Jr., entre outros.

Este Lado do Paraíso – Fragmentos de uma Biografia Inacabada: Entre o final dos anos 1960 e o início dos anos 1970, Mekas passou os verões com Jackie Kennedy, sua irmã, Lee Radziwill, e seus filhos. O período ainda era muito próximo da morte trágica de Kennedy e o convívio com o cinema foi uma das maneiras que Jackie encontrou para ajudar os filhos no luto. Mais tarde, Mekas pensou em fazer uma biografia de John Kennedy, os fragmentos inacabados dessa biografia ele reuniu neste filme.

A Prisão: Em 1964 Jonas Mekas assistiu à última apresentação de The Brig pelo The Living Theatre, antes que o grupo tivesse de desocupar o teatro no qual estavam ensaiando e se apresentando. Impactado, ele convence o grupo a invadir o teatro e a reencená-la uma última vez, na noite seguinte.

Tá aí, um ponto positivo para a Prefeitura de Porto Alegre e sua Secretaria de Cultura - dentre tantos negativos - em trazer para a Capital esses raros (documentos) cinematográficos de Jonas Mekas. Agora, parte da população em ir e prestigiar essa mostra e torcer para que essas iniciativas não se restrinjam a datas comemorativas da cidade. Que sempre seja tempo de prestigiar a cultura!

segunda-feira, 4 de março de 2013

Que as mulheres sigam trabalhando em triplas jornadas

O produto de limpeza Veja diz claramente: "Tudo bem que as mulheres ocupem o espaço público, contanto que elas não deixem de manter as suas casas bem limpinhas!".
É triste viver em mundo cujo o diferencial de uma marca seja "permitir" que uma mulher tenha tempo para trabalhar... Só faltou aquela frase mágica: "Que a mulher possa ir trabalhar fora para AJUDAR o marido com as despesas da casa"... Ah, mas tem outra muito melhor: "Que a mulher possa ir trabalhar fora e ter o seu dinheiro no final do mês para comprar as sua bobagens". Quem nunca ouviu tal despropósito???




No início dessa tarde (04/03/2013), começou a circular pelo facebook um print screen da página da Veja no facebook cuja a descrição dizia o seguinte: "Veja traz inovações para limpar a casa com mais praticidade e para A MULHER ter mais tempo para trabalhar e conquistar seu espaço". Prontamente a descrição da página do facebook foi alterada para: "Veja traz inovações para limpar a casa com mais praticidade e para você ter mais tempo para trabalhar e conquistar seu espaço". Mas persiste no site da referida marca, mais precisamente no seu histórico, o seu ideário machista e sexista. Persiste na dicotomia rosa (para meninas) e azul (para meninos). Persiste na ideia de que meninos brincam de carrinho e meninas brincam de bonecas. Persiste na visão de mundo e no ethos de uma parcela significativa da população mundial.

Persiste em você, que acha tudo isso uma bobagem... Um exagero!

Do Barro ao Asfalto

Gines narra a formação de Alvorada – um município que nasceu sob o estigma de ser uma cidade dormitório – sob a perspectiva da fundação da empresa SOUL. Seguindo a premissa da descontinuidade bachelardiana pode-se inferir que Gines tece a memória a partir da própria situação cotidiana de deslocamento. Gines começa sua narrativa falando da antiga Alvorada, no tempo que a empresa SOUL tinha apenas 90 carros, segue falando de Carlos – um dos fundadores da empresa – fazendo menção ao monopólio da empresa e a interferência que isso tem na vida dos moradores usuários do transporte coletivo. O narrar de seu Gines vem carregado de suas lembranças  não apenas como um morador antigo de Alvorada, mas também como usuário da já referida empresa de transporte e das suas percepções acerca do deslocamento cotidiano.



Titulo: Do Barro ao Asfalto
Roteiro, direção e edição: Luciana Tubello Caldas
Tempo: 5 minutos

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

A mentira como Documentário - Luis Ospina



Um tigre de papel, de Luis Ospina, narra a trajetória de Pedro Manrique Figueroa, militante de esquerda e pioneiro da colagem na Colômbia, a partir de depoimentos de seus contemporâneos – artistas, conhecidos, amigos e amantes. Personalidade turbulenta e complexa, Figueroa tem sua vida e obra analisada de perto pelo olhar atento do cineasta, que tece ainda um delicado painel das transformações políticas e sociais de seu país ao longo do século XX. Mas só há um problema: será que Pedro Manrique Figueroa existiu?

Até aí, nada demais nesta sinopse... É só mais um documentário que narra a trajetória de uma personalidade! Mas, neste caso, fazer essa afirmação seria uma grande mentira, não tão grande e nem tão brilhantemente arquitetada como a contada por Ospina. Não sei se “sacada”  de Ospina reside na construção de um personagem sedutor, cativante e envolvente como Pedro Manrique Figueroa, ou se reside, justamente, em optar pelo gênero documentário para contar uma mentira e transformar o tema principal em pano de fundo, ou seja, a história da Colômbia compreendida entre as décadas de 30 e 80. 

O gênero documentário, comumente, se caracteriza pelo compromisso com a exploração da realidade ou a sua representação – parcial e subjetiva e Ospina desconstrói essa premissa trazendo como protagonista de Um tigre de papel, uma mentira. A palavra “mentira” pode parecer um tanto quanto “pesada”, mas neste caso, “ficção” reduziria toda a grandiosidade de Um tigre de papel e a competência cinematográfica de Luis Ospina. No Brasil, temos como exemplo de documentários que jogam com a tensão entre ficção e realidade, o belíssimo Santiago e o emocionante Jogo de Cena (só para citar os mais "famosos"). Dentro desta proposta (tensionar ficção e realidade), ambos são imbatíveis. Porém, Um tigre de papel de Luis Ospina vai além da realidade e da ficção porque ele conta uma história real (mas para quem essa história seria real?), tendo uma mentira como protagonista.



Título Original: Un tigre de papel
Ano: 2007
Tempo: 115 min
Gênero: Documentário (ou não)
Direção e Roteiro: Luis Ospina
País de Origem: Colômbia



segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Abrindo os trabalhos antropológicos de 2013: Café Antropológico


Desvalorização e discriminação do trabalho doméstico

* Subcapítulo de minha Monografia apresentada, em 09 de julho de 2012, como requisito à obtenção do grau de Bacharela em Ciências Sociais.

A primeira legislação acerca do trabalho doméstico data de 30 de julho de 1923, 88 anos se passaram e no congresso nacional ainda tramitam projetos de leis que pretendem estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre as empregadas domésticas. A discriminação da categoria é histórica, na maior parte dos casos essa é a única alternativa de trabalho para mulheres pobres e semi alfabetizadas. Hoje, o contingente de empregadas domésticas no Brasil representa mais de 7 milhões de trabalhadoras. O que representa 93% de mulheres empregadas no setor doméstico. Dentro deste percentual, 60% são formados por mulheres negras. Portando, a desvalorização e discriminação do trabalho doméstico presente em nossas leis deixam uma dúplice discriminatória que parte da raça superpondo-se a condição feminina.

Cabe destacar a importância das relações de gênero, já que estas comportam uma lógica de associação do trabalho doméstico como trabalho de mulher. É justamente essa definição de lugares entre masculino e feminino – conformada em uma divisão sexual do trabalho – que define quem será o trabalhador doméstico. Ainda com a questão da divisão sexual do trabalho é possível se valer de Heilborn (1999, p. 20) que define gênero “como um sistema simbólico que organiza relações de poder, igualdades e desigualdades no mundo do trabalho”. Esta definição corrobora com o fato de que, no início do século XX as mulheres já eram responsáveis por mais de 80% de todas as ocupações relacionadas ao espaço doméstico. 

Neste contexto histórico e social, de desigualdades é flagrante a ausência de regras legais que conformem e valorizem o trabalho doméstico positivamente. Conforme a cartilha “Trabalho doméstico: direitos e deveres” distribuída pelo Ministério do Trabalho, é considerada empregada doméstica aquela maior de 16 anos que presta serviços de natureza contínua (freqüente, constante) e de finalidade não-lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas. A Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de 1972, regulamentada pelo Decreto nº 71.885, de 9 de março de 1973, dispõe sobre a profissão, conceituando e atribuindo-lhe direitos. Somente na Constituição Federal de 1988, foram atribuídos direitos sociais, como: salário mínimo; irredutibilidade salarial; repouso semanal remunerado; gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, 1/3 a mais do que o salário normal; licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de 120 dias; licença paternidade; aviso prévio; aposentadoria e integração à Previdência Social. Nos anos 2000, a Medida Provisória nº 1.986, acrescenta dispositivos à Lei no 5.859, possibilitando o acesso dos(as) empregados(as) domésticos(as) ao FGTS. Sendo o Seguro-desemprego concedido, exclusivamente, à empregada inscrita no FGTS, por um período mínimo de 15 meses nos últimos 24 meses contados da dispensa sem justa causa. Sendo pago com recursos do FAT, extensão dos benefícios do FGTS as trabalhadoras domésticas. Em 06 de março de 2006 foi editada a medida provisória Nº 284, que altera a legislação do imposto de renda das pessoas físicas e introduz a possibilidade de deduzir a contribuição patronal paga à Previdência Social pelo empregador doméstico incidente sobre o valor da remuneração do empregado. Esta medida provisória teve a intenção de elevar o registro em carteira do trabalhador doméstico, através de concessão de benefício aos empregadores. Ainda no ano de 2006, em 19 de julho, foi editada a Lei n.º 11.324, alterando artigos da Lei n.º 5.859. Nesta edição os trabalhadores domésticos passaram a ter direito a férias de 30 dias, estabilidade para gestantes, direito aos feriados civis e religiosos, além da proibição de descontos de moradia, alimentação e produtos de higiene pessoal utilizados no local de trabalho.

Estes são alguns dos principais direitos e benefícios que amparam a trabalhadora doméstica e que devem ser considerados como verdadeiros avanços no campo jurídico, ainda assim, cabe assinalar os direitos e benefícios que ainda ainda não foram incorporados à categoria: recebimento do abono salarial e rendimentos relativos ao Programa de Integração Social (PIS), em virtude de não ser o(a) empregador(a) contribuinte desse programa; salário-família; benefícios por acidente de trabalho (ocorrendo acidente e necessitando de afastamento, o benefício será auxílio-doença); adicional de periculosidade e insalubridade; horas extras; jornada de trabalho fixada em lei e adicional noturno. 

A questão dos direitos trabalhistas acerca do trabalho doméstico está muito em voga no momento, inclusive, é possível se estabelecer uma relação com a questão dos direitos humanos. Exemplo disto são os debates acerca do tema em nível internacional – como exemplo cito as Conferências Internacionais do Trabalho (CIT) de 2010 e 2011, organizada pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) – que poderá resultar na adoção de um instrumento internacional que regule o trabalho doméstico remunerado. O Programa Regional de Gênero e Trabalho Decente da OIT desenvolveu uma série de oito Notas Técnicas sob o título “O Trabalho Doméstico na América Latina e Caribe” com a intenção de promover o trabalho decente para as trabalhadoras do setor doméstico,além de abordar a questão dos salários dignos para estas trabalhadoras, a erradicação do trabalho infantil doméstico, ampliação da proteção para as trabalhadoras domésticas e o direito de organização das mesmas. Basta uma leitura rápida por alguma destas notas para se perceber o contexto de desigualdades e precariedade em que se encontra o trabalho doméstico na atualidade: 

"Considerando que o trabalho doméstico continua sendo subvalorizado e invisível e é executado principalmente por mulheres e meninas, muitas das quais são migrantes ou membros de comunidades desfavorecidas e, portanto, particularmente vulneráveis à discriminação em relação às condições de emprego e trabalho, bem como outros abusos de direitos humanos. (…) Regulamentar e registrar com exatidão as horas de trabalho realizadas, inclusive as horas extras, definir e informar sobre a taxa de remuneração ou forma de compensação das horas extras e das horas de disponibilidade de trabalho imediata, com fácil acesso dos trabalhadores e trabalhadoras domésticas a esta informação". (OIT, 2011, p. 08). 

Valendo-se de Lynn Hunt que afirma: “os direitos do homem apenas serviram para instituir uma nova, e mais insidiosa, forma de disciplina” (HUNT, 2005, p. 278). É possível inferir que as recomendações feitas pela OIT, isto é, uma regulamentação efetiva da categoria de trabalhadores domésticos, corrobora com a ideia de controle por parte do Estado e por parte do patrão. Em um primeiro momento tendemos a encarar essas mudanças como benéficas para a classe trabalhadora do setor doméstico, porém creio ser necessário olhar o outro lado da moeda questionando se as propostas de mudança e as mudanças ocorridas no âmbito da legislação do trabalho doméstico seriam mudanças que beneficiariam apenas a classe trabalhadora ou, também, a classe que se vale deste serviço. Neste ponto, coloca-se em xeque a dimensão das "táticas" e "estratégias" exercidas pelas trabalhadoras do setor doméstico que se expressa no trabalho como diarista e que permite a estas trabalhadoras um maior controle sobre o seu tempo e sua força de trabalho, algo que provavelmente se perderia, ou se restringiria, na regulamentação plena do trabalho doméstico em que o controle do tempo e da força de trabalho ficariam a cargo do Estado e do patrão.


REFERÊNCIAS

HEILBORN, Maria Luiza e SORJ, Bila. Estudos de gênero no Brasil. In: MICELI, Sérgio (org.) O que ler na ciência social brasileira (1970-1995), ANPOCS/CAPES. São Paulo: Editora Sumaré, 1999. 
HUNT, Lynn. O romance e as origens dos Direitos Humanos: interseções entre história, psicologia e literatura. In: Varia hist., Jul, 2005. 
OIT. Passos para a ratificação da convenção nº 189 sobre as trabalhadoras e os trabalhadores domésticos. (Nota informativa nº 8). Organização Internacional do Trabalho, Escritório no Brasil. Brasília: ILO, 2011

domingo, 24 de fevereiro de 2013

O “uso das mãos” no trabalho doméstico

* Subcapítulo de minha Monografia apresentada, em 09 de julho de 2012, como requisito à obtenção do grau de Bacharela em Ciências Sociais.

A saída de campo realizada no dia 10 de março de 2010 tinha como objetivo construir uma narrativa fotográfica acerca da rotina de trabalho de Vera, trazendo a dimensão da prática cotidiana de limpeza e de cuidados com a casa. A primeira tarefa de Vera era arrumar a cama de Vicente. Vera era ágil e enquanto eu batia as fotografias (em plano aberto) precisei pedir para que ela arrumasse a cama mais devagar, pois as fotos estavam saindo desfocadas. Com a cama arrumada Vera seguiu em direção a cozinha – localizada em uma porta a direita de quem sai do corredor. A cozinha era ampla como a sala. Possuía uma grande mesa, próxima a porta, dois armários, uma geladeira e um fogão (em perspectiva com a porta de entrada da cozinha). No lado esquerdo de quem entra na cozinha localizava-se a pia que estava com algumas louças sujas, como: xícara, faca, copo, prato, etc. E era essa a segunda tarefa cotidiano de Vera: lavar a louça do café da manhã. Procurei captar essa tarefa doméstica utilizando dois enquadramentos diferentes: um plano aberto abrangendo assim, a postura corporal de Vera exercendo a tarefa doméstica e um plano fechado nas mãos de Vera (infelizmente esses plano fechados ficaram muito escuros), enquadrando o gesto de limpeza de um copo. Após a louça ser lavada Vera começou a varrer a cozinha, novamente recorri ao enquadramento em plano aberto. Vera, em todas as suas tarefas, era muito rápida, tanto, que enquanto ela varria a cozinha eu precisava pedir para que ela fosse mais devagar, para que as fotos não saíssem tremidas. Novamente recorri ao plano aberto para capturar a limpeza do banheiro e ao plano fechado nas mãos/gestos de Vera. Perguntei para Vera o que ela ainda tinha para fazer. Vera respondeu que ainda teria que varrer a sala e o pátio.

No dia 24 de agosto de 2010 realizei com Marion uma saída de campo com o mesmo objetivo – de construir uma narrativa fotográfica acerca do trabalho doméstico. Marion iniciou suas atividades recolhendo o lixo da cozinha, procurei fotografa-la em seus gestos (plano fechado) e em seu contexto (plano aberto) sem sucesso, pois os movimentos de Marion eram rápidos e as fotos em close acabaram ficando desfocadas e as em que deveriam ser em plano aberto acabaram ficando em plano médio por conta do pequeno espaço na cozinha. Após recolher o lixo, Marion seguiu para o quarto, para arrumar a cama. Novamente a agilidade de Marion não permitiu que eu tirasse fotografias com um bom foco. Para poder evocar a ideia de movimento e agilidade presentes no cotidiano do trabalho doméstico foi preciso utilizar o dispositivo de captação contínua em três quadros, tendo assim, um encadeamento de três planos, que juntos evocam essa ideia do movimento e da agilidade do trabalho doméstico. Ainda que as fotos saíssem desfocadas, poderia explorar a ideia de movimento que aquele “desfoque” trazia tirando as fotos em sequencia. Do quarto seguimos para a área de serviço onde Marion pôs as roupas sujas de molho. Marion explicou que como ela vai à casa de Ana as terças e quintas-feiras ela sempre procura lavar as roupas na terça-feira e passá-las na quinta-feira. Após colocar as roupas de molho Marion seguiu para o banheiro, onde iria iniciar a limpeza. No banheiro observei que Marion limpava o chão de joelhos com um pano. Perguntei se não era melhor utilizar um esfregão do tipo bruxa. Marion respondeu que Ana havia comprado uma bruxa, mas que ela não gostava de usar, pois parecia que não deixa o chão limpo. Acrescentou que também não gostava de usar luvas, tinha a sensação de que atrapalhavam o movimento das mãos na hora de limpar. Terminada a limpeza no banheiro seguimos para a cozinha para lavar a louça! Em tom de confissão Marion disse: “Sabe, ela não faz nada! Se cair um papel no chão, fica! Fica tudo pro dia que eu venho!”. 

Destas descrições é possível inferir o quanto a câmera fotográfica participou como mediadora deste processo de interação, realizando um recorte do espaço em que se dá a situação etnográfica e um recorte da duração temporal deste “estar-lá” (GEERTZ, 2002). A partir do encadeamento destas imagens realizadas no processo denominado de pós-campo, processo este que se refere ao tratamento das imagens produzidas (escrita do formulário de avaliação, análise, conceituação e nomeação das fotografias) e a partir das discussões semanais realizadas no âmbito GT Fotografia, que me foi possível pensar os gestos, movimentos e as práticas que circunscrevem o trabalho doméstico.

Algumas fotos foram tiradas valendo-se do plano aberto, para assim trazer a idéia de todo contexto em que aquela prática está inserida. Já a opção para a maioria das fotos foi o do plano fechado nas mãos e gestos de Vera e Marion, enquanto realizam suas tarefas domésticas. Conforme nos aponta François Soulages em Esthétique de la Photographie (1998), para vários pontos de vistas, temos várias fotografias que engendram universos diferentes. Nesta análise estética da fotografia o autor concluiu que a fotografia não é somente material ou ferramenta, mas ela é o principal vetor estrutural da criação. Sensível a esta potência criadora da fotografia e privilegiando o ponto de vista do plano fechado nos gestos e práticas destas trabalhadoras atento o meu olhar para o “uso das mãos” (FRANCO, 1997) o que nos faz perceber o quanto este trabalho manual é significativo para a conformação simbólica do trabalho doméstico. Oriundo de um sistema econômico escravista, o trabalho doméstico, carrega os valores negativos que circunscreveram esse sistema, dentre eles a degradação do trabalho manual. Logo, o menosprezo pelo “uso das mãos” – atrelado a escravidão – arraigou-se culturalmente no imaginário brasileiro, corroborando para a desvalorização e discriminação do trabalho doméstico.


REFERÊNCIAS:

FRANCO, Maria Sylvia C. F. Homens livres na ordem escravocrata. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997.
GEERTZ, Clifford. Obras e vidas. Rio de janeiro: Ed. UFRGS, 2002.

Documentário: Onde se mora não é onde se trabalha

Alvorada - Região Metropolitana de Porto Alegre/RS, nome que refencia a população constituída em sua maioria por trabalhadores que acordam nas primeiras horas da manhã para trabalhar em Porto Alegre (Capital). Parto do estudo das trajetória sociais de duas mulheres, moradoras de Alvorada que trabalham como empregadas domésticas em Porto Alegre: Vera, 60 anos é usuária da linha Passo da Figueira via Ipiranga há aproximadamente dois anos, e a utiliza segunda a sábado. Vera embarca com o ônibus já lotado todos os dias na parada 51, no Bairro Formoza, em Alvorada. Marion, 57 anos, é empregada doméstica há 34 anos. Utiliza a linha Passo da Figueira via Ipiranga nas terças e quintas-feiras. Segundas, quartas e sextas-feiras é usuária da linha Alvorada via Assis Brasil. Seu embarque ocorre na parada 52, Bairro Bela Vista, em Alvorada. Cenas cotidianas de deslocamento e trabalho narram, a partir dos gestos e práticas de Marion a rotina desse viver urbano de embarques e desembarques, de conversas e interações, de espera e de trabalho. A estas cenas cotidianas cruzam-se as lembranças de Vera, lembranças do bairro que um dia abrigou a sua morada e hoje abriga a casa em que ela trabalha.

Direção: Luciana Tubello Caldas
Roteiro: Luciana Tubello Caldas
Edição: Luciana Tubello Caldas
Som: Luciana Tubello Caldas e Stéphanie Bexiga
Imagens: Ana Paula Parodi Ederdardt, Luciana Tubello Caldas, Marize Schons e Renata Tomaz do Amaral.

Para assistir: Onde se mora não é onde se trabalha