sábado, 27 de abril de 2013

Tarantino sem Sally Menke

De "Cães de Aluguel" até "Bastardos Inglórios", Quentin Tarantino teve como seu braço direito a montadora Sally Menke, que morreu em 2010, aos 56 anos e sem ganhar um Oscar da Academia. "Django Livre" é o primeiro filme de Tarantino sem Sally Menke e isso é perceptível já nos primeiros minutos de filme. Veja bem, não estou dizendo que "Django Livre" seja ruim, “Django” é um excelente filme, mas falta algo de Tarantino nele: temos a violência, o sangue, os diálogos inteligentes, mas... Falta! Falta a mão precisa e rápida da montadora Sally Menke, uma das responsáveis pelo estilo Tarantino, com uma montagem dinâmica, que abusa dos planos curtos. Esse dinamismo não aparece em “Django”, com exceção de algumas cenas, como por exemplo, no flashback da vida do casal Django e Brunhilde, que lembrou muito o estilo Sally Manke de montar; aquela sucessão de planos milimétricamente enlaçados e que não deixam o espectador respirar, muito menos desgrudar os olhos da tela.
 
Fred Raskin assumiu o posto de Manke com competência, mas também, com um certo receio. Percebemos isso em seu corte comedido e sem muita ousadia. Mas a culpa não é Fred Raskin, esse receio também está no roteiro de Quentin Tarantino. Em relação aos seus filmes anteriores (com exceção de “À Prova de Morte” e “Jackie Brown”) a estrutura narrativa do filme não é dividida por capítulos e nem foi concebida de uma maneira completamente não linear. Ou seja, “Django Livre” tem uma estrutura narrativa linear e cronológica, e é neste ponto que percebemos o quanto a figura de Sally Manke se destacou, como uma das melhores e mais criativas montadoras dos últimos tempos.

Durante as filmagens, Tarantino pedia para que os atores
dessem um "olá" para Sally, que veria todo o material
na sala de edição.

Se hoje, compreendemos os filmes de Tarantino – o seu tempo diegético fatiado em mil pedaços que não seguem uma linearidade – devemos isso a Sally Menke, que juntou estes mil pedaços lançados por Tarantino, dando sentido à sua louca genialidade. Quentin Tarantino não foi o único responsável, por fazer de Pulp Fiction o filme mais reconhecido e influente da década de 90. Este mérito, sem sombra de dúvida, deve ser dividido com Sally Menke, que fez muito mais do que ligar um plano no outro; ela abriu escola, lançando um novo “sentido” e “forma” (Eisenstein, 2002) de montar. Para finalizar, eu gostaria de reiterar que “Django Livre” é um excelente filme. Porém, ele é o anúncio do tamanho da perda que Sally Manke representa, não só para Tarantino, mas também, para o cinema.

terça-feira, 16 de abril de 2013

Agarrando Pueblo - Luis Ospina

Recentemente fiz um post sobre Un tigre de papel de Luis Ospina e neste final de semana tive o prazer de ver/conhecer outra obra deste diretor – Agarrando Pueblo. É uma pena que um diretor como Ospina seja pouco lembrado por aqui (Brasil). No site de relacionamento Filmow, por exemplo, constam apenas duas obras: Un tigre de papel e Agarrando Pueblo. O primeiro foi assistido por uma pessoa (vale frisar que eu fui a pessoa quem marcou como visto e também cadastrou o filme no site) e o segundo foi visto por 8 pessoas. Pode ser que os meus parâmetros de análise não sejam os mais indicados, mas parto do princípio que o filmow é um site bastante popular, com cerca de 300 mil usuários. Em suma, diante destes dados (ainda que sejam dados incipientes) me sinto no dever de escrever mais sobre este diretor e tecer algumas considerações sobre Agarrando Pueblo (não que eu seja grande coisa, mas tô fazendo a minha parte de ao menos apresentar esse diretor ao meu círculo de amigos). 
Luis Ospina, nasceu na Colômbia em 1949 e estudou cinema na Califórnia, onde fez seus primeiros curtas-metragens. Voltou para Colômbia e a partir dos anos setenta fez parte de um grupo preocupado em promover a cultura cinematográfica no país, através de uma proposta fílmica documental e contra as convenções da produção nacional. É neste contexto que se insere o filme Agarrando Pueblo; uma resposta contundente à “Cultura da Pobreza” de Oscar Lewis – muito em voga na época – parodiando a “pornomiséria” – prática indiscriminada de documentários que, com o pretexto de denunciar as agruras do terceiro mundo, perpetuavam os estereótipos da pobreza.
O filme acompanha uma equipe de filmagem que roda um “documentário” nas ruas e periferias de Cali e Bogotá para uma emissora de TV alemã, manipulando situações e criando personagens ao longo do caminho. Mais uma vez a mistura entre documentário e ficção se faz presente (ver Un tigre de papel) incitando a reflexão: “qual o nosso olhar sobre a pobreza?” ou melhor “sob que parâmetros ideológicos nosso olhar sobre a pobreza foi construído?”.
Diante de questões tão pertinentes e atuais, esta obra merece lugar de destaque, dentre as produções cinematográficas que ousam brincar com a hierarquia social.  E Ospina vai além, invocando para que a base da pirâmide social zombe daqueles que insistem em os olhar por cima.



Título: Agarrando Pueblo
País: Colômbia
Tempo: 28 minutos
Ano: 1977
Direção: Luis Ospina

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Essa estranha amizade homofóbica


Amizade (do latim amicus) deriva de amore (há quem diga que essa palavra vem do grego). Em suma, amizade e amor tem suas aproximações etimológicas e por tudo que aprendi e vivi em minhas relações humanas e sociais, concordo com o que a etimologia diz. Amizade é amor! É uma relação afetiva e como em toda relação de amor/afeto tendemos a desejar o melhor ao outro, neste caso, o nosso amigo.
As coisas começam a se complicar quando ouvimos o maior de todos os clichês homofóbicos: “Tenho vários amigos gays, mas sou contra que eles se casem”. Em outras palavras: “Tenho vários amigos gays, mas sou contra que eles sejam felizes”.
Por isso eu escrevo esse post, para que os usuários deste clichê respondam: Que significado amizade tem para vocês, no mundo de vocês? Porque no meu mundo, amizade é o que o latim (ou grego) disse que era... Amor. E no sofrido aprendizado das relações humanas e sociais eu aprendi que quando a gente ama uma pessoa, a gente quer que essa pessoa seja feliz! Que quando a gente ama; a gente ri, chora e luta junto. Mas parece que nesse estranho mundo da intolerância a amizade significa outra coisa.
Ah, mas sempre tem alguém para dizer: “Mas nós amamos os homossexuais, só não amamos o seu “homossexualismo” (com “ismo” mesmo, porque é assim que eles falam). Mas, antes que comece o blá blá blá que deus (com minúscula mesmo) não aceita o casamento entre pessoas do mesmo sexo, que tá na bíblia e blá blá blá... Eu vou sair na frente e dizer:

“O amigo ama em todos os momentos; é um irmão na adversidade”. (Provérbios 17:17)

“Não abandone o seu amigo nem o amigo de seu pai; quando for atingido pela adversidade não vá para a casa de seu irmão; melhor é o amigo próximo do que o irmão distante”. (Provérbios 27:10)

E agora? Parece que o significado da palavra amizade (como amor e afeto) é universal... Até está nessa tal bíblia! Então, por que vocês distorcem isso? Amizade é uma coisa muito linda e não merece ser usada como arma da intolerância de vocês. Se você não concorda com o casamento gay, então não se case com alguém do mesmo sexo! Simples, assim... E, principalmente, não diga ser amigo de um gay, sendo que você é contra a sua felicidade. Disso, nem a onça gosta!

sexta-feira, 5 de abril de 2013

A produção acadêmica acerca do tema 'empregadas domésticas'

* Subcapítulo de minha Monografia apresentada, em 09 de julho de 2012, como requisito à obtenção do grau de Bacharela em Ciências Sociais.

Gostaria de delinear um panorama do que tem sido produzido a respeito do tema 'empregadas domésticas'. Inicio este panorama trazendo o resultado de buscas no Scielo (www.scielo.org) no mês de junho de 2012, utilizando os indicadores: empregadas domésticas, trabalho doméstico e trabalho doméstico. Desta busca encontrei sete trabalhos produzidos a partir de diferentes áreas de conhecimento.
Na área das ciências humanas temos os artigos de Brites (2007) e Sanches (2009) respectivamente intitulados: Afeto e desigualdade: gênero, geração e classe entre empregadas domésticas e seus empregadores e Trabalho doméstico: desafios para o trabalho decente. Brites (2007) centra a sua análise na questão da ambigüidade afetiva entre os empregadores e as trabalhadoras domésticas reforçando um sistema estratificado e hierárquico de gênero, classe e cor. Sanches (2009) atenta para a importância do conceito de trabalho decente, promovido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), para o trabalho doméstico e a equiparação de seus direitos em relação aos demais trabalhadores e trabalhadoras que que contam com a regulação da CLT.


Na área da saúde temos os artigos: Emprego em serviços domésticos e acidentes de trabalho não fatais e Representações do trabalho informal e dos riscos à saúde entre trabalhadoras domésticas e trabalhadores da construção civil; respectivamente de Santana (2003) e Iriart (2008). O primeiro trabalho trata da alta incidência de acidentes de trabalho entre as trabalhadoras do setor doméstico. O segundo aponta para a questão dos trabalhadores informais da construção civil e das trabalhadoras domésticas, igualmente informais, analisando representações e percepções sobre a informalidade do contrato de trabalho e dos riscos à saúde entre trabalhadores informais acidentados, apontando para a necessidade de construção de políticas públicas visando a segurança e saúde destes trabalhadores e trabalhadoras. 
Na psicologia temos Santana e Dimenstein (2005) com o artigo Trabalho doméstico de adolescentes e reprodução das desiguais relações de gênero, que utiliza os resultados de uma pesquisa realizada com jovens trabalhadoras do setor doméstico – menores de 18 anos – que acumulam tarefas escolares e de trabalho, sob condições trabalhistas desiguais e irregulares. O objetivo deste estudo, realizado em Natal (RN), é analisar o trabalho doméstico de adolescentes na perspectiva das relações de gênero com a categoria de classe social.
Por fim, o mais recente artigo encontrado é da economia: Impacto da redução dos encargos trabalhistas sobre a formalização do trabalho doméstico de Theodoro e Scorzafave (2011), em que avaliam o impacto causal da Lei 11.3241 sobre a formalização do trabalho doméstico no Brasil. Os dados foram extraídos do banco Mensal de Empregos do IBGE entre os anos 2004 e 2007, tendo um resultado inconclusivo, já que, algumas estimativas mostraram efeitos positivos enquanto outras não foram significativas.
No Banco de Teses da CAPES (www.capes.gov.br), no mês de junho de 2012, utilizando o descritor: “empregadas domésticas”, foi localizado 10 trabalhos, na área das ciências sociais sobre o tema, publicados a partir de 2000. 
Nos anos 2000, temos a publicação de Brites (2000): Afeto, desigualdade e rebeldia – bastidores do serviço doméstico; tese de doutorado em que realizou um estudo etnográfico sobre as relações de poder entre as empregadas domésticas e empregadores entre os anos de 1996 e 1998, no estado do Espírito Santos. Também contamos com a publicação da dissertação de mestrado de Barbosa (2000): Articulação casa trabalho: migrantes nordestinos nas ocupações de empregada doméstica e empregado de edifício, este estudo buscou explorar a integração de trabalhadores – homens e mulheres de origem camponesa da região Nordeste – empregadas/os em casa de família ou em edifícios como porteiros ou auxiliares de limpeza. 
Após quatro anos, temos nova publicação: Minha área é casa de família: o trabalho doméstico na cidade de São Paulo, tese de doutorado de Brandt (2004) que analisa a inserção feminina no mercado de trabalho, atentando para a diminuição de empregadas domésticas que dormem no emprego. 
No ano de 2007, houve a publicação de dois trabalhos referentes ao tema: Cursos para trabalhadoras domésticas: estratégias de modelagens de Oliveira (2007) e O que é viver com os patrões? Trabalho e cidadania das empregadas que moram com os patrões de Dias (2007), ambas dissertações de mestrado. O primeiro trabalho trata-se de uma etnografia dos cursos oferecidos para trabalhadoras domésticas e as nuances de seus discursos. O segundo trata do desinteresse que as empregadas domésticas, que dormem no emprego, têm pela atividade. 
No ano seguinte temos a dissertação de mestrado de Harris (2008): Você vai me servir: desigualdade, proximidade e agência nos dois lados do Equador, que parte de um estudo etnográfico comparativo das relações entre empregadas domésticas e seus empregadores, no Brasil e nos Estados Unidos, analisando as particularidades históricas do trabalho doméstico em cada país.
Quatro trabalhos foram publicados em 2009: Ávila (2009) apresentou as práticas de trabalhadoras domésticas na cidade do Recife com a tese de doutorado, buscando compreender as tensões cotidianas em torno do uso do tempo. Oliveira (2009) em Conflitos sobre a categoria trabalho doméstico: entre (in)definições, lutas e mudanças, dissertação de mestrado, analisa a regulação do trabalho doméstico e seu processo de disputas e debates acerca de sua legitimação. Pineyro (2009) também trata da dificuldade de reconhecimento e legitimação do trabalho doméstico pela perspectiva ambigüidade afetiva entre trabalhadoras e empregadoras, em sua dissertação de mestrado intitulada: O pedaço doméstico: empregadas domésticas na luta pelo reconhecimento. Por fim, Santana (2009) na dissertação de mestrado Entre os discursos, as representações e as práticas: crianças e jovens empregadas domésticas na cidade de Marília, trata do serviço doméstico remunerado como um espaço de inserção no mercado de trabalho, que a pesar de seu caráter compulsório e exploratória, era visto como uma oportunidade para a melhoria de vida.


REFERÊNCIAS

ÁVILA, Maria Betânia de Melo. O tempo do trabalho das empregadas domésticas. Tensões entre dominação/exploração e resistência. Tese (Doutorado) – Departamento de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2009.

BARBOSA, Fernando C. Articulação casa trabalho: migrantes nordestinos nas ocupações de empregada doméstica e empregado de edifício. Dissertação (Mestrado) – Universidade Fluminense, Rio de Janeiro, 2000. 

BRANDT, Maria Elisa Almeida. O conflito entre empregadores domésticos e a atuação do sindicato: os sentidos da mediação. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 1998. 

BRITES, Jurema. Afeto e desigualdade: gênero, geração e classe entre empregadas domésticas e seus empregadores. In: Cad. Pagu, Dez, nº 29, 2007. 

________. Afeto, desigualdade e rebeldia – bastidores do serviço doméstico. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2000.

DIAS, Edgar R. O que é viver com os patrões? Trabalho e cidadania das empregadas que moram com os patrões. Dissertação (Mestrado) – Centro Universitário Euro Americano – Direitos Humanos, Cidadania e Violência – UNIEURO, Brasília, 2007.

HARRIS, David E. Você vai me servir: desigualdade, proximidade e agência nos dois lados do Equador. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.

IRIART, Jorge Alberto Bernstein et al. Representações do trabalho informal e dos riscos à saúde entre trabalhadoras domésticas e trabalhadores da construção civil. In: Ciênc. Saúde coletiva, Fev. Vol.13, nº 1, 2008.

OLIVEIRA, Emanuela Patrícia de. Cursos para trabalhadoras domésticas: estratégias de modelagens. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2007.

OLIVEIRA, Raquel Barros de. Conflitos sobre a categoria emprego doméstico: entre (in)definições, lutas e mudanças. Dissertação (Mestrado) – Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro, 2009.

PINEYRO. Fabian J. O pedaço doméstico: empregadas domésticas na luta pelo reconhecimento. Dissertação (Mestrado) – Fundação Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, 2009.

SANCHES, Solange. Trabalho doméstico: desafios para o trabalho decente. Rev. Estud. Fem., Dez, Vol.17, nº 3, 2009.

SANTANA, Juliana N. Entre os discursos, as representações e as práticas: crianças e jovens empregadas domésticas na cidade de Marília. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, São Paulo, 2009. 

SANTANA, Munich and Dimenstein, Magda. Trabalho doméstico de adolescentes e reprodução das desiguais relações de gênero. In: Psico-USF (Impr.), Jun, vol.10, nº 1, 2005.

SANTANA, Vilma S et al. Emprego em serviços domésticos e acidentes de trabalho não fatais. In: Rev. Saúde Pública, Fev, vol.37, nº 1, 2003.

THEODORO, Maria Isabel Accoroni; SCORZAFAVE, Luiz Guilherme . Impacto da redução dos encargos trabalhistas sobre a formalização das empregadas domésticas. Rev. Bras. Econ., Mar, vol. 65, nº 1, 2011.